Crise, desaquecimento da economia e instabilidade. Palavras e expressões que há algum tempo norteiam as ações de diferentes setores de mercado. As empresas que atuam e prestam serviços logísticos frigorificados, entretanto, parecem passar à margem desse cenário.
Isso não quer dizer que o setor não sofra com os reflexos de um ambiente tumultuado, mas a procura por novas soluções parece ser o ponto central hoje na atividade. E foi isso que mostrou a quarta edição do Simpósio da Cadeia do Frio, realizado em São Paulo e promovido pela Global Cold Chain Alliance (GCCA) Brasil & Associação Brasileira da Indústria de Armazenagem Frigorificada (Abiaf), que reuniu 120 profissionais.
O presidente da Abiaf, Francisco Moura, divulgou, por exemplo, as mais recentes iniciativas da entidade, como a criação do comitê de gestão de risco. Além disso, revelou que a associação realizou a Pesquisa Brasileira de Produtividade e Benchmarking. “Nossa ideia é comparar com outros países a produtividade para que as empresas do Brasil avaliem como estão e qual o seu cenário”, diz. Os dados serão revelados ao final deste ano.
Mas as projeções são otimistas. Segundo Moura, apesar do cenário econômico, a indústria do frio brasileira aumentará sua capacidade este ano em 5%. Hoje, demonstra ele, o país conta com 10 milhões de m³ de capacidade, em 178 armazéns. “O Brasil será cada vez mais forte na cadeia do frio global”, aposta.
Para isso, é preciso saber o que está acontecendo lá fora. Foi o que fez o presidente e CEO da GCCA, Corey Rosenbusch, ao abordar o tema Fundos de Investimentos e Consolidação na Cadeia do Frio. Na opinião dele, antes é preciso entender o porquê os fundos de investimentos estarem interessados na cadeia do frio. Para ele, é simples. “Os fundos estão investindo no setor em todo o mundo, pois verifica-se nesse mercado um desempenho financeiro positivo”, define. Ele diz que ainda não há como mensurar quantos fundos atualmente já investem ou orbitam junto à indústria logística frigorificada.
Rosenbusch também lembra que é necessário ficar de olho em outro movimento: as fusões e aquisições, que, no seu ponto de vista, irão ocorrer cada vez mais. No Brasil, Frederico Barros, do Pátria Investimentos, garante que já há esse movimento e existem muitas oportunidades.
A América Latina segue essa tendência. Isso é o que diz o gerente do Friopuerto Montevideo, Pablo Firpo. “Fusões e aquisições estão numa curva ascendente. No mundo, de forma geral, está crescendo, pois ainda há muitos locais que precisam ser desenvolvidos. Temos espaço para crescer, principalmente na América Latina, como no Paraguai”, diz.
Fique de olho
Com tudo isso, onde estão as oportunidades para os operadores logísticos frigorificados que atuam no Brasil? O food service é uma delas. O COO do Grupo GS&Libbra, Eduardo Yamashita, expões números para reforçar essa tendência. Segundo ele, o setor crescerá este ano no Brasil 7% e, para 2020, a projeção inicial é manter esse índice. Vale lembrar que é uma atividade que fatura no país R$ 211 bilhões por ano, com a expectativa de chegar a R$ 340 bilhões no próximo ano.
E como atendê-los? A diretora executiva do Grupo GS&Libbra, Cristina Souza, ressalta a simplicidade nas operações, com foco no desenvolvimento de tecnologias e digitalização dos processos. Além disso, verificar o crescimento, por exemplo, na demanda por produtos processados e prontos, a otimização do mix de produtos, a implantação cada vez mais acelerada de restaurantes sem cozinha e a concepção de rotisseries e células de exposição.
O comércio exterior também deve ser observado com atenção. A coordenadora de Inteligência e Acesso a Mercados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Bruna Kassama, indica que novos acordos, como o firmado junto à União Europeia, a peste suína africana e algumas mudanças no fluxo de comércio, ampliando o acesso a mercados, precisam ser analisados e avaliados com carinho pelas empresas do setor.
Ela lembra, contudo, um ponto crucial. “O Brasil ainda não tem entrepostos habilitados para realizar movimentações para alguns países que exigem, como China, Coreia do Sul, Chile e México”, diz. Trata-se de um aspecto importante, pois, de acordo com a executiva, o entreposto deve ser um facilitador para que as indústrias possam exportar sua produção.
Experiências internacionais
Não basta, porém, conhecer as oportunidades. É preciso desenvolvê-las. E o presidente e CEO da RLS Logistics, Anthony Leo, apresentou o trabalho desenvolvido pela companhia nos Estados Unidos. “Nosso foco é agregar valor aos serviços com a implantação, por exemplo, de fulfillment”, resume.
O executivo conta que hoje a empresa atua basicamente nas costas Leste e Oeste do país, mas, seguindo o plano de ação e o foco em agregar valor, irá inaugurar em 2020 pontos de fulfillment na região central dos Estados Unidos a fim de reduzir o tempo de entrega. “Nosso desafio ainda é ter integração operacional e aplicar as tecnologias”, reconhece.
Por esses motivos, Leo já traçou um plano para os próximos anos mirando a implementação de machine learning, inteligência artificial e análise de produtividade. Reforçar a atuação no e-commerce, que já representa 15% nos negócios da empresa, estreitar o relacionamento com as companhias de varejo, food service e reforçar o atendimento ao consumidor final também fazem parte do escopo de ações.
E o que diz o cliente?
Identificar os pontos que podem ser atacados e empregar experiências internacionais bem-sucedidas podem representar um bom avanço. Mas ouvir os clientes ainda é uma das principais ações. Quais as demandas, os desejos, necessidades e urgências?
O diretor de Logística da Marfrig Global Foods, Luciano Alves, acredita que os operadores logísticos frigorificados deverão fazer a gestão integrada das operações, com armazenagem e transporte caminhando juntos. Além disso, continua, é preciso começar a pensar em operações compartilhadas. “Estamos construindo uma plataforma digital para aplicar inteligência artificial na logística da empresa”, diz. Segundo ele, essa é a forma de a companhia verificar e tornar a logística mais homogênea.
O gerente de Qualidade, Comercial e Logística da BRF, concorda com Alves e salienta que o desafio é a logística colaborativa a fim de que haja redução de custos para todos os players da cadeia do frio. “O operador que também adotar compliance e gestão de food safety com certeza será visto de outra maneira”, frisa.
Fábio Penteado