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Quando o "quando" conta: reequilíbrio cautelar como ferramenta para a continuidade de contratos de concessão em tempos difíceis

Por Mariana Avelar e Rafael Fernandes el 24 de septiembre de 2024 a las 9h21
Mariana Avelar

A recente aplicação de medida cautelar para viabilizar a reconstrução do Aeroporto Internacional de Porto Alegre, após um evento climático de força maior, é um passo relevante em direção à reconstrução da infraestrutura gaúcha. A Decisão nº 683/2024 da Agência Nacional de Aviação (ANAC) responde à necessidade de uma atuação célere do poder público federal em prol da continuidade de serviços essenciais, prestados em regime de parceria com a iniciativa privada.

As medidas cautelares consideraram “o caráter excepcional e urgente de conter as perdas econômicas em andamento”, bem como a “necessidade de assegurar o restabelecimento rápido das operações aéreas e aeroportuárias”. O cerne da decisão consiste no deferimento cautelar do pleito de reequilíbrio apresentado pela concessionária.

O deferimento cautelar será operacionalizado pelo pagamento de um valor à concessionária, a título de antecipação de parte do montante a ser recomposto em eventual revisão extraordinária do Contrato de Concessão. Para tanto, será necessária a prévia anuência do Ministério de Portos e Aeroportos, além de uma avaliação da Superintendência de Regulação Econômica de Aeroportos (SRA). Oxalá não tardem, pois o próprio fundamento dessas ações cautelares é a urgência.

A tomada dessa decisão decorre das competências institucionais da ANAC e do poder de cautela descrito no art. 45 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 (Lei Federal de Processo Administrativo) e nos arts. 5º e 300 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil - CPC).

A decisão que defere o reequilíbrio cautelar também estipula prazos e etapas para os próximos passos a serem tomados pelos interessados. Vale lembrar que a cautelar é reversível, e a decisão definitiva sobre o pleito de revisão extraordinária deverá abordar o tratamento da medida cautelar e a repercussão de seus efeitos jurídicos durante sua vigência. A decisão já encontra precedentes importantes na prática administrativa brasileira.

 

Essa história não começou aqui: o pioneirismo do Estado de São Paulo

O estado de São Paulo foi o primeiro a consolidar, em regulação, a possibilidade de reequilíbrio cautelar em concessões. Por meio da Resolução SPI nº 19/2023, a administração paulista permitiu que seus contratos de concessão, em diversos segmentos do setor de infraestrutura, utilizassem esse tipo de solução.

Na regulação estadual, o uso do reequilíbrio cautelar é uma faculdade da Secretaria de Parcerias em Investimentos (SPI), embora a norma estabeleça que a SPI deve se manifestar sobre a pertinência do uso dessa ferramenta sempre que o evento represente risco à continuidade dos serviços públicos e à criação de passivos regulatórios ao final da concessão, ou desequilíbrios com valores significativos.

A SPI também definiu os eventos que podem ser objeto de reequilíbrio cautelar. Esse reequilíbrio só pode ser aplicado em duas hipóteses: (i) pleitos de reequilíbrio já deferidos, em que apenas falta definir a metodologia; (ii) pleitos de reequilíbrio cujo deferimento é presumido, devido à similaridade com outros já apreciados anteriormente no próprio contrato ou pelo mesmo órgão competente no setor. Em qualquer caso, o reequilíbrio cautelar não pode exceder 80% do valor total do pleito.

 

Cenas dos próximos capítulos: a hora e a vez da ANTT

A ANTT está se preparando para editar sua regulamentação sobre medidas cautelares e de urgência para garantir o equilíbrio econômico-financeiro das concessões federais. No dia 22 de agosto, foi publicada a Reunião Participativa nº 14/2024, com o objetivo de receber contribuições da sociedade civil sobre a minuta de instrução normativa que tratará do tema no futuro.

A medida vem em boa hora pois, nos últimos anos, o setor tem enfrentado eventos de desequilíbrio de grande porte e complexidade técnica que desafiam os métodos tradicionais de recomposição contratual como instrumentos capazes de criar soluções rápidas, garantindo a prestação dos serviços públicos sem maiores percalços.

A complexidade desses pleitos dificulta o processo decisório, sobretudo pelo desafio de alcançar consensos sobre a metodologia de recomposição. Não é raro que pleitos, cuja convicção jurídica já está estabelecida, se arrastem por indefinições técnicas na forma de aplicação. Um exemplo recente são os pedidos de recomposição oriundos da pandemia de COVID-19, que ainda estão na agenda regulatória do setor.

Em outros casos, a extensão dos impactos causados pelo evento de desequilíbrio é tão grande que o rito ordinário de análise dos pleitos não é ágil o suficiente para garantir a normalidade da operação do serviço público. Os desastres ambientais que afetaram o estado do Rio Grande do Sul são exemplos nesse sentido.

Diante das novas demandas no setor, a ANTT busca, por meio da Instrução Normativa submetida à apreciação da sociedade civil, ampliar seu instrumental regulatório para a tutela do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos com dois novos mecanismos: o reequilíbrio parcial de natureza cautelar e o reequilíbrio parcial de evidência. Ambos são considerados medidas para mitigar desequilíbrios contratuais e se aplicam a hipóteses distintas. 

O reequilíbrio parcial de natureza cautelar destina-se a situações em que a mitigação dos impactos financeiros sobre a concessão é urgente, devido às suas repercussões no fluxo de caixa do projeto e na prestação do serviço. 

 

Para sua aplicação, o caso concreto deve atender a três condições especificadas pela norma:
- Probabilidade do direito da concessionária;
- Risco de dano ou perigo à continuidade e qualidade dos serviços concedidos;
- Impacto financeiro estimado ou conjunto de eventos superior a 5% da receita bruta do último exercício financeiro da concessionária.

 

Em linha com as tutelas de urgência do direito brasileiro, a ANTT estabelece que o reequilíbrio cautelar não poderá ser deferido se houver risco de irreversibilidade da medida. 

O reequilíbrio parcial de evidência, por outro lado, aplica-se a pleitos em que o direito é incontroverso ou já está em condições de reconhecimento imediato. A utilização dessa medida foi considerada, na minuta, como um instrumento excepcional, que só poderá ser utilizado se o prazo do reequilíbrio for longo e o pleito tiver valor significativo.

A ANTT também pretende instituir um limite ao valor das medidas mitigadoras do reequilíbrio, restringindo-o a 80% do valor total estimado para o desequilíbrio – patamar idêntico ao adotado pelo Estado de São Paulo. 

No dia 03 de setembro, a ANTT conduziu a reunião com todos os interessados em apresentar contribuições, em que aprimoramentos relevantes foram discutidos. Roger da Silva Pêgas, Superintendente de Infraestrutura Rodoviária (Surod/ANTT), enfatizou, na ocasião da reunião, que "essa nova instrução vem para evitar que contratos cheguem a situações críticas que exigem uma intervenção regulatória intensa, envolvendo ANTT, Ministério dos Transportes e TCU (...) evitando o estresse contratual futuro".

Em qualquer cenário, o movimento é positivo, pois amplia a capacidade do setor em garantir a sustentabilidade de seus vínculos, sem descurar da continuidade dos serviços públicos.

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