Mesmo antes do termo virar moda, a logística sempre foi o coração dos negócios da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD), maior grupo brasileiro de varejo, composto pelas bandeiras Pão de Açúcar, Extra Hipermercados, CompreBem, Sendas e Extra Eletro. A empresa anuncia mudanças em sua cadeia de abastecimento que atingirão em cheio o relacionamento com seus fornecedores. É o "Top Log", um sistema de certificação que pretende, através de um melhor entrosamento das cadeias logísticas da CBD e dos fornecedores, reduzir o índice de rupturas nas lojas e a cobertura de estoques, trazendo como conseqüência redução de custos logísticos, o que pode se refletir em menores preços ao consumidor final.
O "Top Log" foi anunciado dia 14 de dezembro na sede da empresa, em São Paulo, num encontro que reuniu mais de 70 dos maiores fornecedores da empresa, que representam cerca de 50% das vendas. O Pão de Açúcar já estava operando nesse novo modelo com alguns fornecedores em projetos-pilotos e, na ocasião, alguns eles foram reconhecidos pelos resultados alcançados ao longo de 2003 e 2004, como BSH Continental, Sadia, Kaiser, Schincariol, Refriso e Anhembi.
"Na verdade, eles não foram premiados, porque o "Top Log" não é uma premiação e sim uma certificação. Além disso, o projeto ainda não havia sido anunciado oficialmente", ressalta Luís Ricardo Marques Pedro (foto), diretor da Cadeia de Suprimentos da CBD. Em 2005, a empresa pretende triplicar o número de fornecedores certificados, conforme declarou o diretor.
O objetivo principal do "Top Log" é aumentar o atual nível de serviços da CBD, que atualmente é de 81% (considerando acuracidade de entrega e quantidades corretas), de modo que seja próximo dos níveis internacionais. Segundo Marques Pedro, os principais problemas enfrentados na cadeia são o desrespeito aos horários de entrega, o uso de veículos inadequados e os parâmetros de abastecimento desbalanceados.
A CBD trabalha com dois modelos de abastecimento: um em que os fornecedores entregam nos centros de distribuição da empresa e, de lá, os produtos são consolidados e seguem para as lojas; e outro em que os fornecedores entregam diretamente nas lojas, o que é determinado pelas características dos produtos (congelados, FLV ou produtos sazonais, por exemplo). Cerca de 83% dos produtos passam pelas centrais e 17% são entregues diretamente nas lojas.
No primeiro caso, o nível de serviço do grupo é de 98%, igual ao benchmark internacional; já no segundo modelo, o ED (entrega direta), o nível de serviço é bem inferior, em torno de 81%, frente a 99% dos níveis mundiais. É justamente este índice que a CBD quer melhorar. A ruptura média de estoques do Grupo baixou de 9,5% em 2002 para uma média geral de 4,5% este ano. Porém, este índice é diferente para os dois modelos de reposição. No ED, chega a ultrapassar os 10%. Mesmo assim, os índices medidos da CBD são melhores que o do principal concorrente.
Além de um melhor abastecimento das lojas, a melhoria desses índices permitirá também a redução dos atuais níveis de cobertura de estoques, em torno de 30 dias, para cerca de 25 dias, reduzindo o capital investido e os custos logísticos.
Mudança gradual
Marques Pedro explica que, na verdade, as mudanças na logística do Grupo começaram há alguns anos. "Em 1998, iniciamos a centralização dos estoques, com a inauguração de nosso primeiro centro de distribuição. Ao longo desses anos, várias iniciativas foram feitas, como o recebimento agendado, o rastreamento de caminhões, cross-docking e até o VMI (Vendor Management Inventory – sistema em que o próprio fornecedor se encarrega de repor automaticamente os estoques com base no consumo diário das lojas), e investimentos pesados em tecnologia. É um processo que vem ocorrendo paulatinamente", explicou o diretor.
Com isso, a CBD saiu de um nível de serviço de 58%, em 2002, para 78% em 2004, chegando aos atuais 81%. Esse índice, ressaltou o diretor, não é igual para todos os Estados: ele é de 66% na Bahia, 72% no Distrito Federal, 73% em Pernambuco, 76% no Paraná, 77% no Ceará, 84% no Rio de Janeiro e 89% em São Paulo. Esses são os locais onde a CBD possui suas centrais de distribuição. São seis unidades em São Paulo, duas no Rio, duas em Curitiba, duas em Brasília, duas na Bahia, uma em Recife e uma em Fortaleza. Em São Paulo, todas são unidades especializadas. Os demais locais possuem uma unidade especializada e uma multi-categoria, sendo que Recife e Fortaleza possuem apenas unidades multi-categorias.
O diretor destacou ainda que a certificação não será um fator de exclusão de fornecedores, visando principalmente aumentar o grau de integração deles com a CBD. "Muitas vezes, conseguimos grandes resultados com medidas simples, que antes não eram tomadas porque não havia essa maior colaboração. E, em alguns casos, reconhecemos que quem deve mudar somos nós e não o fornecedor."
Ele citou como exemplo de mudanças o caso de embalagens contendo menos produtos – que beneficiam lojas com menor giro – e que podem ir diretamente dos fornecedores para as gôndolas sem a necessidade de separação no depósitos.
A CBD opera uma rede de 554 lojas em 12 Estados brasileiros – uma área de vendas superior a um milhão de m2 – e 60 mil funcionários. Possui uma área de estocagem de 316 mil m2, com cerca de 80 mil SKUs e 5.500 fornecedores. Expede uma média de 1.500 cargas por dia dos centros de distribuição para as lojas. Em 2003, o Grupo Pão de Açúcar teve um faturamento bruto de R$ 15 bilhões. A CBD não divulga o quanto os custos logísticos representam dentro do faturamento da empresa e nem o quanto pretende reduzir desses custos com o projeto.