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O método do centro de gravidade é apropriado para o seu projeto de rede de suprimentos?

Por Mauro Sampaio em 7 de maio de 2024 às 6h41
Mauro Sampaio

Se você está auxiliando uma empresa na escolha da melhor localização para um centro de distribuição, é provável que já tenha se deparado com a complexidade das decisões logísticas. Vamos considerar um cenário: a empresa possui dois clientes-chave, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, separados por uma distância de 500 quilômetros. Enquanto o cliente em São Paulo demanda 600 unidades do produto, o cliente no Rio de Janeiro necessita de 300 unidades. Diante dessa situação, surge a pergunta: onde seria o local mais adequado para localizar um centro de distribuição?

a) No ponto médio, a 250 quilômetros de ambos os clientes.
b) A 167 quilômetros de São Paulo e a 333 quilômetros do Rio de Janeiro.
c) A 333 quilômetros de São Paulo e a 167 quilômetros do Rio de Janeiro.
d) No local do Cliente A (São Paulo).
e) No local do Cliente B (Rio de Janeiro).
f) Nenhuma das opções acima.

A análise convencional de Centro de Gravidade (CoG) aponta para a opção (b), considerando o ponto médio da demanda entre São Paulo e Rio de Janeiro. No entanto, essa abordagem pode divergir do principal objetivo logístico: a minimização de custos. Como profissional de logística, o foco não está na determinação do epicentro da demanda, mas sim na identificação da solução mais econômica. Na prática, a alternativa mais eficiente seria a (d) - estabelecer o centro de distribuição em São Paulo e despachar os produtos a 500 quilômetros até o Rio de Janeiro. Essa estratégia reduziria a distância total percorrida por unidade, resultando em custos de transporte mais baixos. Apesar de ansiarmos por uma simplicidade nas soluções logísticas, frequentemente nos deparamos com a complexidade da realidade. Neste cenário, evidencia-se o paradoxo clássico dos estudos de centro de gravidade - embora simples e convincentes, são apenas uma aproximação do que o especialista em logística busca otimizar: custo e tempo de serviço.

O Paradoxo dos Estudos de Centro de Gravidade
Se você já se deparou com estudos de centro de gravidade, deve ter notado que, embora sejam simples e intuitivos, podem levar a decisões subótimas quando se trata de otimização de rede logística. Embora úteis, esses estudos têm suas limitações.

O método do centro de gravidade é apropriado para o seu projeto de rede de suprimentos?

Os estudos de centro de gravidade frequentemente baseiam suas análises na distância em linha reta entre pontos, supondo que essa métrica seja um indicador confiável de custo e tempo de entrega. No entanto, essa suposição nem sempre reflete a realidade operacional. Existem diversos fatores que podem influenciar os custos e tempos de entrega de forma significativa, tornando a distância em linha reta apenas um dos aspectos a ser considerado.

A disparidade nos custos de mercado por região é evidente: os custos logísticos variam consideravelmente de acordo com a geografia. As tarifas de transporte variam por quilômetro, dependendo da região, devido a diferenças na demanda. Por exemplo, as tarifas de frete em Recife podem ser significativamente diferentes por quilômetro das tarifas em São Paulo. Além disso, é importante notar que os custos de mercado variam consideravelmente conforme a direção: a taxa real por quilômetro para transportadoras de carga completa pode diferir em até três vezes ou mais. Em mercados como em São Paulo, onde a saída de mercadorias supera a entrada, os envios para essa região podem ser consideravelmente mais econômicos. No entanto, os custos de transporte de saída podem ser muito mais elevados. Assim, ponderar apenas a distância ao tomar decisões logísticas pode levar a análises enganosas. É crucial considerar todas as variáveis relevantes para obter uma visão precisa e informada da situação.

Obstáculos Geográficos: Montanhas, rios, áreas urbanas densamente povoadas e outros obstáculos geográficos podem aumentar significativamente os custos e tempos de entrega. Rotas que parecem ser mais curtas em um mapa podem exigir desvios significativos na realidade, resultando em custos adicionais de transporte e maior tempo de trânsito.

As restrições logísticas do mundo real são frequentemente negligenciadas nos cálculos de CoG. No entanto, essas restrições são fundamentais para encontrar a solução mais adequada. Por exemplo, limitações de espaço de armazenamento, capacidades de produção, condições de armazenamento (ambiente versus congelado), prazos máximos de entrega, entre outros, devem ser levados em conta de forma simultânea na análise. As localizações reais podem apresentar diferentes impactos de custo, como custos elevados de aluguel e/ou mão de obra em comparação com outras áreas.

O método de transporte é desconsiderado nos cálculos de CoG. Assim, para clientes que possuem uma diversidade de entregas, como pacotes, LTL e FTL, em seus perfis de entrega aos clientes, é imprescindível considerar mais do que apenas as variáveis de distância ponderada. Os custos de envio por quilômetro ou por quilo variam significativamente em uma rede de entrega multimodal mista e devem ser incorporados à análise.

Os algoritmos do CoG tendem a focalizar principalmente nos Km de entrega e no fluxo de demanda, negligenciando os custos associados ao transporte entre fornecedores e fábricas. Essa abordagem limitada pode resultar em uma análise incompleta da complexidade dos custos logísticos envolvidos na determinação da localização ideal para os Centros de Distribuição (CDs). A experiência mostra que esses custos de "entrada" têm um peso significativo na determinação da localização dos CDs, muitas vezes superando os custos de entrega, especialmente devido à concentração dos pontos de origem. Contudo, é importante ressaltar que a otimização dos fluxos de saída, mesmo quando realizada através da análise do CoG, não garante necessariamente a solução com o menor custo total entregue. Apesar do transporte de saída ser tipicamente mais caro por quilômetro, o transporte de entrada continua a ser fundamental na maioria dos casos, especialmente quando os insumos vêm de vários mercados e direções, influenciando assim a determinação da localização ideal dos CDs em direção aos fornecedores.

Por que os Estudos de Centro de Gravidade são tão utilizados?
A simplicidade dos estudos de centro de gravidade os torna uma ferramenta popular para tomadas rápidas de decisão em otimização de rede. No entanto, essa simplicidade pode ser enganosa. Projetos mais complexos demandam uma abordagem mais sofisticada, que leve em consideração uma série de variáveis, como custos de transporte reais, obstáculos geográficos e padrões específicos de demanda. Embora sejam rápidos e forneçam resultados compreensíveis, os estudos de centro de gravidade se tornaram uma prática aceita pela indústria simplesmente por serem percebidos como "suficientemente bons". No entanto, é importante destacar que esses modelos são inerentemente imprecisos. O perigo inerente é que esses estudos muitas vezes colocam o centro de gravidade longe da localização ótima. É raro um diretor de logística que está disposto a deixar economias de 5-6% sobre a mesa.

Situações em que uma análise do centro de gravidade adiciona valor:

⦁    Redes de Entrega Direta ao Consumidor (RED) com múltiplas paradas: Quando uma rede RED possui uma alta concentração de clientes no mesmo código postal, a análise do centro de gravidade se torna crucial. Isso porque, para a demanda RED, o custo de entrega de última milha é o maior componente de custo da rede de suprimentos. Portanto, minimizar a média ponderada de quilômetros percorridos para entrega está frequentemente alinhada com o centro de gravidade identificado.

⦁    Seleção de locais candidatos para Centros de Distribuição (CD): Utilizar a análise do centro de gravidade como um insumo preliminar para estudos de projeto de rede pode ser muito proveitoso. A identificação de pontos centrais para concentrações de demanda pode orientar a seleção de locais para CD, proporcionando uma base para um modelo de projeto de rede de suprimentos de alta qualidade considerar essas localizações como uma opção viável.

⦁    Redes de CD únicos sem grandes investimentos em software: Para redes de CD que não justificam investimentos substanciais em softwares avançados ou que não possuem profissionais qualificados para operar tais sistemas, a análise do centro de gravidade oferece uma alternativa eficaz. Essa análise pode facilitar decisões de logística e gestão de suprimentos sem a necessidade de recursos tecnológicos avançados.

Em Busca de uma Abordagem Mais Precisa
Para tomar decisões mais informadas e eficazes sobre a localização de centros de distribuição, é essencial adotar uma abordagem mais holística. Ferramentas avançadas de modelagem de rede oferecem uma visão mais precisa dos custos e tempos de entrega, permitindo que as empresas tomem decisões mais informadas e eficientes.
Imagine que você está planejando onde construir novos centros de distribuição (CDs) para enviar seus produtos para os clientes. Você não pode simplesmente colocar esses CDs em qualquer lugar. Eles precisam estar em locais estratégicos, como perto dos clientes ou em áreas onde o acesso seja fácil para o transporte. Além disso, a proximidade com os fornecedores também é fundamental.

O software de otimização de rede faz todo esse trabalho por você. Ele analisa uma tonelada de possíveis locais onde você poderia construir esses CDs. Em vez de olhar para apenas alguns lugares, como você faria manualmente, ele olha para milhares de opções diferentes.

Então, o software utiliza uma ampla gama de informações sobre cada local, como custo de aluguel, acessibilidade, proximidade com clientes e fornecedores. Para cada uma dessas localizações, o software inteligente calcula rapidamente algumas estatísticas-chave, como a distância média ponderada (em quilômetros) e a porcentagem da demanda dentro de 100, 200 e 300 quilômetros da cidade selecionada. Com base nessas informações, o software identifica os melhores lugares para construir os Centros de Distribuição (CDs).

A Figura 1 apresenta os pontos de clientes de uma empresa em um mapa fictício. Essa análise simples proporciona uma visão imediata da distribuição geográfica dos clientes, da extensão da base de clientes e da quantidade de regiões onde são realizadas entregas.

Figura 1 – Localização de clientes e centro de gravidade 

O método do centro de gravidade é apropriado para o seu projeto de rede de suprimentos?

Fonte: Watson, 2013
 

Para mapear os clientes no mapa, foi necessário associar cada ponto de cliente a valores de latitude e longitude, um processo conhecido como geocodificação. Enquanto algumas empresas já possuem esses dados prontamente disponíveis internamente, softwares de modelagem de rede podem realizar essa tarefa automaticamente. Alternativamente, diversos sites também oferecem essas informações. 

A seleção de localização ótima muitas vezes não faz sentido com base apenas na geografia dos locais de destino. Agora, precisamos adicionar a demanda ao modelo. Os estudos usam quantidades históricas ou previstas de produtos a serem entregues a cada um dos clientes por exemplo, um cliente que recebe 300 caminhões por ano de produto será mais importante do que aquele que recebe apenas 50 caminhões. Claro é menos dispendioso estar mais próximo de um cliente que recebe 300 caminhões do que estar mais próximo de um cliente que recebe apenas 50.

Para especificar a demanda de cada cliente, precisamos determinar a unidade de medida apropriada. Precisamos de uma medida que nos ajude a aplicar corretamente os custos e capacidades de fabricação e logística associados. Por exemplo, muitas empresas se referem aos custos de transporte em termos de "custo por caminhão" e à capacidade de produção em termos de "unidades por hora". Se a demanda for medida em termos de receita, não teremos como determinar quantos "reais" cabem em um caminhão ou quantos reais podem ser produzidos em uma hora. Determinar a melhor unidade de medida para demanda, produção e transporte é um passo importante no início de todos os modelos de projeto de rede de suprimentos.

Outra pergunta que enfrentará ao começar sua coleta de dados de demanda provavelmente será: "Qual horizonte de tempo devemos analisar?" Estudos típicos de design de rede usam um ano inteiro de demanda. Além de ser um período comum para muitas empresas, revisar um ano inteiro de atividade dentro de uma rede de suprimentos garante que todos os picos e vales dos padrões de compra de seus clientes sejam considerados em sua análise. Estudos mais completos já pensam em 5 anos de demanda.

Retornando ao problema formal, se nos pedissem para escrever o problema atual que você está tentando resolver, ele seria declarado da seguinte forma: "Encontre as melhores 'P' instalações (CDs) que minimizem a distância total ponderada da instalação ao cliente, assumindo que cada instalação possa satisfazer a demanda total do cliente e que toda a demanda seja satisfeita."

Com essa definição, podemos assumir que a medida de "melhor" é que estamos minimizando a distância ponderada para os clientes. Também vamos assumir que estamos escolhendo as instalações a partir de um conjunto predefinido de localizações. Forneceremos uma lista das 25 localizações mais frequentemente selecionadas para CDs nesta região para usar como uma lista potencial para selecionar. Suas escolhas de instalações são mostradas na Tabela 1. Com um conjunto predefinido de instalações, podemos então construir uma matriz com a distância entre cada instalação e cada cliente. Na maioria dos casos, estamos interessados na distância rodoviária entre dois pontos. Isso pode ser facilmente e automaticamente calculado com software de modelagem de rede de qualidade comercial.

O método do centro de gravidade é apropriado para o seu projeto de rede de suprimentos?

O CoG, apesar de ser considerado o centro da demanda, apresenta resultados ruins em termos de % de demanda atendida até 100, 200 e mesmo 300 Km. A Cidade 22, localizada no ponto extremo oeste, não surpreende ao apresentar desempenho abaixo do esperado em todas as métricas-chave. Avançando em direção ao leste, a partir da Cidade 22, analisamos também as Cidades 20 e 15. Embora nenhuma delas se destaque nas estatísticas, a Cidade 5, situada próxima ao centro do território, apresenta uma distância média ponderada relativamente aceitável. Já as Cidades 4 e 10 despertam maior interesse. Apesar de estarem geograficamente distantes de qualquer centro físico ou matemático, ambas dominam em termos da porcentagem de clientes que se encontra dentro de uma determinada distância. Tanto a Cidade 4 quanto a Cidade 10 contam com 24% dos clientes dentro de um raio de 100 Km, superando os 17% da Cidade 11. Da mesma forma, a Cidade 10 se destaca na porcentagem de clientes dentro de 200 e 300 milhas. A localização da Cidade 10 é extremamente conveniente para a grande maioria dos clientes neste estado fictício. No final, a solução geralmente se inclina em direção ao ponto com a demanda máxima possível. Essa abordagem mais pragmática e alinhada com a realidade do problema pode ser otimizada com o uso de técnicas de programação linear e inteira, como o algoritmo "Distance-Based Approach", para determinar as cidades candidatas considerando os custos fixos e variáveis de entrada e saída. Em seguida, é possível aprimorar o modelo por meio da inclusão de estoques, impostos e CO2 em uma modelagem de rede.

Os profissionais de logística rapidamente percebem que ao comparar as localizações candidatas, conseguem explorar melhor a complexidade do problema, trocando o foco da análise da simples distância média pela consideração da porcentagem de clientes dentro de uma determinada distância.

Dessa forma, você pode tomar decisões mais inteligentes e eficientes sobre onde colocar seus CDs, sem precisar gastar tempo olhando para muitas opções. O software faz todo o trabalho duro por você, garantindo que você escolha os melhores locais para sua empresa.

Considerações finais
O centro de gravidade é uma ferramenta tradicional na caixa de ferramentas do logístico, mas é importante reconhecer suas limitações. Ao confiar cegamente nesses estudos, as empresas correm o risco de tomar decisões subótimas que podem resultar em custos mais altos e tempos de entrega mais longos.  O centro de gravidade é eficaz para equilibrar bandejas ou garantir a estabilidade de aeronaves em voo, mas não é adequado para o projeto de rede de suprimentos.
Em vez disso, é hora de adotar uma abordagem mais holística e baseada em dados para a localização de centros de distribuição. Ao utilizar ferramentas de modelagem de rede de logística avançadas, as empresas podem tomar decisões mais informadas e eficazes, garantindo uma rede de suprimentos mais eficiente e resiliente.
Finalmente, embora haja o desejo de que a execução da otimização nos dê uma única resposta correta, o mundo é mais complicado do que isso. Na prática, ao tomar uma decisão estratégica importante, é mais importante executar vários cenários para entender os trade-offs e entender o valor marginal de adicionar instalações. Essas informações podem então ser combinadas com objetivos comerciais estratégicos para tomar uma decisão final.

Referência
Watson, M. (2013). Supply chain network design: applying optimization and analytics to the global supply chain. Pearson education.
 

*Prof. PhD. Mauro Sampaio
Pós-doutorado em Supply Chain Management pelo Fischer College of Business da Ohio State University (OSU-USA) e pela Chalmers University of Technology (CHALMERS-Suécia). Doutor e Mestre em Administração de Empresas pela EAESP/FGV. Engenheiro de Produção-Materiais pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). 

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