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Logística reversa de pós consumo e a economia circular: uma nova cultura

O consumo, em todas as partes do mundo, tem crescido a uma taxa 3 vezes maior do que a taxa de crescimento da população.
Por Redação em 7 de junho de 2022 às 15h00 (atualizado às 15h11)
Redação

A discutida globalização, acentuada a partir dos anos 80, contribuiu para o aumento exponencial das quantidades de produtos fabricados e distribuídos em todos os micros segmentos de mercados em todas as partes do mundo. Contribuiu, da mesma forma, para um ambiente empresarial de alta concorrência mundial, que busca incansavelmente por inovações e diversificação dos produtos com ciclo de vida mercadológica e útil cada vez menores.

Como consequência tem-se uma profusão de diferentes produtos e materiais sendo descartados pela sociedade e, caso não sejam adequadamente reaproveitados, constituirão “Resíduos Sólidos”, de diferentes espécies, erroneamente denominados “Lixos”, que em contato com o meio ambiente originarão poluição contaminante ou poluição por excesso.

 “Sete bilhões de seres humanos produzem anualmente 1,4 bilhão de toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) — uma média de 1,2 kg por dia per capita. Quase a metade desse total é ­gerada por menos de 30 países, os mais desenvolvidos do mundo. Se o número parece assustador, cenário ainda mais ­sombrio é traçado por estudos da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Banco Mundial: daqui a dez anos, serão 2,2 bilhões de toneladas anuais. Na metade deste século, se o ritmo atual for mantido, teremos 9 bilhões de habitantes e 4 bilhões de toneladas de lixo urbano por ano.” (Revista Discussão – Senado Federal do Brasil- edição 22)

A Logística Reversa de pós-consumo é a atividade que equaciona o fluxo de retorno de parte destes resíduos descartados, garantindo as operações de reaproveitamento. No entanto são diversas as dificuldades para esse equacionamento de forma organizada e em quantidades adequadas:

·     A sociedade habituou-se, ao longo dos últimos séculos com um sistema de consumo em que o bem, durável ou descartável, é adquirido, usado e em seguida descartado em um esquema linear (compre - use – descarte);

·     Os grandes progressos industriais e mercadológicos, garantindo continuados aumentos de produtividade foram baseados, até então, nas ideias desse esquema linear;

·     A responsabilidade pelo equacionamento da Logística Reversa do retorno de produtos usados, modernamente denominados de “resíduos”, nem sempre é bem “entendida” pelos agentes das cadeias de suprimentos, tornando-se “difusa” entre eles. No Brasil, a Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, promulgada e regulamentada no ano de 2010, é explícita quanto ao compartilhamento dessa responsabilidade entre os membros das cadeias de suprimentos;

·     As matérias-primas reaproveitadas e os produtos remanufaturados concorrem no mercado, direta ou indiretamente, com os produtos ou matérias primas originais, evidenciando conflitos de interesses de intensidade variada;

·     Os custos das operações de reaproveitamento e a complexidade da Logística Reversa são relevantes;

·     Existem restrições técnicas e, algumas vezes, preconceito industrial quanto ao uso de materiais reciclados e produtos remanufaturados. Da mesma forma o cidadão apresenta dúvidas para o uso e a compra de produtos com conteúdo de reciclados, na maior parte das vezes por falta de informação correta ou por falta de garantia de sua qualidade;

A história mostra que a geração de “lixo” de resíduos, como aqui o estamos entendendo, não é natural, mas um fenômeno criado pelo homem, principalmente pelos processos de industrialização desde o século XVIII com a revolução industrial.

Cada vez mais fica evidente que a sociedade não pode ficar omissa às montanhas de desperdícios de produtos e materiais de todas as espécies presentes, com maior ou menor intensidade, em boa parte do globo, que na verdade não se constituem de “Lixos”, mas de “Resíduos”, e como tal, eventualmente poderiam ser evitados ou, no limite, reaproveitados de alguma maneira. 

Durante os últimos séculos o mundo habituou-se com a estratégia econômica da denominada “economia linear”, caracterizada pela extração das matérias-primas, transformando-as em produtos que serão consumidos e descartados na natureza, gerando os “Resíduos” de todas as espécies. Enquanto as quantidades de produtos e consumo eram relativamente baixas os danos causados eram pequenos, pois geravam baixas quantidades de “Resíduos”, porém, como já salientado, a situação é bem diversa atualmente com o seu crescimento exponencial.  

Uma nova visão ou modelo de economia, que se opõe à “Economia Linear”, emerge atualmente com o nome de “Economia Circular”, estratégia definida como o conjunto de sistemas, envolvendo sociedade, governo e empresas, visando reduzir a formação de resíduos e de amenizar o seu impacto no meio ambiente através de seu reaproveitamento. Pode ser entendida como uma estratégia econômica que complementa a Logística Reversa de Pós Consumo nesse sentido estratégico. A Economia Circular propõe uma nova visão sobre a extração de matérias-primas, sobre o projeto dos produtos e sua fabricação, sobre o reaproveitamento eficiente de materiais e produtos descartados e a sua posterior apresentação inovadora ao mercado, como produto reaproveitado.

A Economia Circular tem uma lógica energética, considerando que do total da energia consumida por um determinado produto 75% corresponde à extração das matérias primas envolvidas e somente 25% é utilizada em sua fabricação.  Sob o ponto de vista do reaproveitamento, a lógica de economia energética é ainda mais visível, pois a recuperação da energia gerada pelos processos de reaproveitamento apresenta níveis altos.

A reciclagem do alumínio, por exemplo, requer 25% da energia em relação à fabricação do alumínio, comum aos demais metais com cifras diferentes, porém o reaproveitamento sempre representa um consumo porcentual de energia muito menor do requerido para a sua fabricação.

Ainda, para se ter uma ideia das vantagens energéticas, o porcentual da quantidade de metais reaproveitáveis presentes em uma placa eletrônica é muito maior do que aquele encontrado em minas de minérios. No caso do cobre, a porcentagem desse metal em placas eletrônicas é de 15% a 30% em peso enquanto uma mina contém somente 0,5% a 2% deste metal.

O “Lixo de Resíduos” é, portanto, uma das fontes mais baratas de obtenção de matérias-primas e de energia!!

Embora seja muito lógica, sob o ponto de vista de consumo de energia e de preservação da natureza, a implantação da Economia Circular é complexa e envolve um novo papel dos agentes sociedade-governo-empresas, exigindo mudanças de paradigmas desafiadores, tais como:

·     Existência de lideranças empresariais para avanço das ideias;

·     Conscientização e comprometimento da sociedade;

·     Uma nova maneira de conceber produtos e processos, desde a extração das matérias primas até o seu reaproveitamento eficiente;

·     Novas legislações facilitadoras;

·     O desenvolvimento de novos materiais que permitam melhor reaproveitamento;

·     Processos em que cada etapa de produção seja concebida para a utilização de seu output como input na etapa seguinte, até o seu reaproveitamento como resíduo, reduzindo os resíduos em geral;

·     A intensificação dos processos de reaproveitamento dos resíduos;

·     Redução de preconceitos sobre materiais e produtos reaproveitados;

·     Novas formas de consumo que substituam a venda pela locação do serviço;

·     A intensificação do uso de tecnologias 4.0, que contribuirão para a redução de desperdícios na fabricação e em outras áreas;

Embora se possa admitir certos exageros nos hábitos de consumo atual, a ideia de que a sua simples redução seja uma solução é pouco factível pois, além da dificuldade de sua aplicação devido aos hábitos enraizados, esta diminuição impactaria diretamente na quantidade de empregos, aumentando ainda mais o nível de desemprego que o mundo atravessa. Portanto, a redução de resíduos no meio ambiente deverá ser atenuada pela adoção do modelo da Economia Circular e da Logística Reversa de Pós-Consumo. Estas atividades complementares criam novas cadeias industriais e comerciais, contribuindo para a geração de quantidade apreciável de novos empregos e poderão compensar, mesmo que parcialmente, as possíveis reduções para a qual caminhamos inevitavelmente com as novas tecnologias 4.0 e a robotização do mundo atual.

O movimento ESG (Environment, Social and Governance) (Sustentabilidade Ambiental, Social e Governança Empresarial), sigla inglesa que avalia a performance empresarial em relação a esses aspectos, tem tido um papel importante na decisão de investidores em bolsas de ações e projetos de investimentos pelo mundo. Esta moderna visão empresarial estimula a adoção de ações que apoiam as ideias da Economia Circular.

O esquema a seguir destaca as principais ideias e etapas dessa Nova Cultura e o papel dos agentes Sociedade, Governo e Empresas, responsáveis por estas mudanças.

No centro do esquema destaca-se o ciclo virtuoso da Economia Circular com as atividades da Logística tradicional e da Logística Reversa de pós-consumo. As matérias primas são extraídas e transformadas em produtos duráveis ou descartáveis, que serão encaminhados para o mercado através das diversas possibilidades de canais de distribuição diretos. Esses processos industriais gerarão descartes de materiais, produtos defeituosos ou equivalentes, além dos resíduos industriais. O mercado, neste esquema, simboliza os clientes intermediários (B2B) e os consumidores finais (B2C) que descartam materiais e produtos.

Logística reversa de pós consumo e a economia circular: uma nova cultura

Em uma ótica do modelo de economia circular teríamos estes diversos tipos de resíduos reduzidos em sua geração, reaproveitados e reintegrados ao ciclo produtivo. Reaproveitamento de reuso nos mercados próprios ou secundários, integrando componentes reaproveitados na fabricação de um novo produto, ou ainda reintegrando matérias primas recicladas na fabricação, entre outras possibilidades de reintegração.

Sinteticamente:

À Sociedade caberia:

·     Uma mudança de paradigma para o desenvolvimento de hábitos de consumo que privilegiem a Economia Circular e a Logística Reversa;

·     Incentivar a mídia na divulgação destas ideias;

·     Manter nítidos os ensinamentos dessa nova cultura em suas atividades de educação;

·     Incentivar a mudança, já em curso pelas novas gerações em algumas sociedades, da mudança da propriedade do bem para o consumo do serviço.

Ao Governo caberia:

· Promulgar leis que contribuam com as ideias de um novo modelo, principalmente aquelas que, de alguma forma, facilitem a sua aplicação, como legislações fiscais e de incentivos às atividades dentro destas novas ideias;

·   Incentivar e recompensar a aplicação das ideias do novo modelo na área educacional;

·  Aplicar penalização aos eventuais descaminhos às legislações propostas.

Às Empresas caberia:

· Incentivar lideranças empresariais que desenvolvam as atividades de responsabilidade ambiental, reestudando seus projetos e atividades operacionais de forma a melhor adaptar seus produtos às ideias da Economia Circular;

· Dedicar recursos e esforços especiais ao ecodesign de seus produtos e aos demais aspectos de produção, contribuindo para a redução de resíduos e tornando os produtos reaproveitados tão competitivos como os originais, sob o ponto de vista do design e do custo;

· Envolver-se, diretamente ou através de terceiros, com as atividades de reaproveitamento, emprestando seu conhecimento técnico e de mercado, podendo certamente obter lucros ainda não percebidos;

· Investir no desenvolvimento de novas tecnologias de reaproveitamento de resíduos visando produtividade e redução de custo, que certamente aumentarão a quantidade de empregos;

· Dar maior atenção ao desenvolvimento de atividades de locação de seus equipamentos, vendendo os serviços, o que permitiria produtos com maior durabilidade física. Como exemplo o cliente compraria lavagens de roupa e não a máquina, cuja manutenção seria à cargo do fornecedor do serviço, que teria interesse na durabilidade do equipamento e a realização de upgrades;

· Investir em tecnologias 4.0 que permitiriam a redução de resíduos e maior eficiência nos processos assim como auxiliar na elaboração dos projetos de novos produtos que permitam reaproveitamentos eficientes gerando produtos atrativos. Tecnologia de fabricação aditiva 3D, inteligência artificial IA, internet das coisas IoT, robôs avançados, entre outras.

 Percebe-se pelo exposto que o caminho para a mudança de modelo de consumo não é simples, mas não pode ser ignorado sob pena de se ver crescer ainda mais a cena de “lixos” espalhados pelo mundo, afetando a vida da própria sociedade!!

Com todo realismo e pragmatismo e evitando qualquer conotação romântica, Sociedade, Governo e Empresas, sem exceção, deverão fazer atenção a estas mudanças para um futuro mais adaptado às novas condições da sociedade.  

Logística reversa de pós consumo e a economia circular: uma nova cultura
Paulo Roberto Leite, presidente do Conselho de Logística Reversa do Brasil (CLRB)
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