Não há qualquer dúvida, por falta de providências deste governo, e mesmo considerando positiva a criação do Comitê de Coordenação de Combate à Pandemia (1), nosso País já chegou ao “caos” e ao “desastre” é total: cerca de 13 milhões de pessoas contaminadas e mais de 331 mil vidas perdidas, por si só, demonstram o tamanho dos nossos erros e da nossa incompetência (2) e comprovam o colapso em nossos sistemas hospitalar e sanitário. Adicione-se a isso, os momentos de instabilidade institucional provocados pelo ‘destempero emocional” e pela inépcia do Presidente da República, a total desorganização da economia, da sociedade e dos serviços públicos (3) e o comportamento absurdo e indiferente dos poderes legislativo e judiciário que, infelizmente, ainda permitem real e concreto atentado à Democracia.
O Brasil já alcançou os níveis mais baixos que se poderia permitir a uma nação minimamente organizada e que se proponha a trabalhar objetivando o bem estar de sua população e a prevalência do Estado Democrático de Direito.
E se como exemplo, ainda não temos o Orçamento Público de 2021 aprovado (4), fruto da incompreensão de urgência na qual vive o País, também somos obrigados a conviver com decisões jurídicas estapafúrdias (liberação de cultos religiosos no auge da pandemia, transformação do Lula em ‘mocinho’ e do Moro em ‘bandido’) de nossa mais ‘alta corte’. No caso do orçamento, além do governo perdido, percebe-se claramente que a maioria do Congresso Nacional somente se move em torno de seus próprios interesses, e no caso do STF, uma “fonte de insegurança jurídica” (5).
Ainda recentemente, em um de meus artigos (“Atividades econômicas somente voltarão à “nova” normalidade após equacionamento dos principais problemas nacionais. Jamais antes”), eu comentei que “considerando o crescimento incontrolável da pandemia e o colapso no sistema hospitalar, que tem gerado números cada vez maiores de infectados e mortos, deve-se priorizar as pessoas. Queiramos ou não, pois além de um problema de injustiça social e humanitário, totalmente indesejável, será daqui que virão os maiores problemas. E, sem dúvida, “num contexto ainda mais complicado, caso nada seja feito”.
E finalizei o artigo conclamando todos os agentes econômicos a discutirem, com o governo central, os principais e verdadeiros problemas nacionais, de forma a “pressioná-lo a uma forte e séria revisão do que até agora se fez, reconhecer erros e discutir uma proposta de convergência, cujo objetivo maior deve ser o bem estar coletivo”.
Está claro para todos que antes da pandemia, notadamente aqui no Brasil, assuntos voltados ao saneamento básico e à saúde pública (assim como da educação), nunca tiveram a importância correspondentes, exceto quando se observavam seus “altos valores” e, portanto, rubricas das Contas Nacionais passíveis de sofrerem razoáveis cortes.
Em julho de 2020, pesquisa publicada pela McKinsey (6), “Priorizando a saúde: uma receita para a prosperidade”, indicavam que a pandemia e seus respectivos impactos, iriam custar, ainda em 2020, cerca de 8% do PIB mundial (entre US$ 7 e US$ trilhões?) e que uma saúde precária, anualmente, cerca de 15% do PIB mundial, “com mortes prematuras e perda de potencial produtivo entre a população em idade ativa”.
Depois de listar quatro grandes providências (Faça da saúde uma parte fundamental das discussões sobre crescimento econômico; Invista em saúde para construir maior resiliência; Promova a equidade social e econômica através da melhoria da saúde; e Aproveite o momento da pandemia para abordar outras condições de saúde), a pesquisa concluía que além de se buscar ferramentas para acelerar a recuperação econômica, “as organizações em todo o mundo” precisam “repensar a saúde como um investimento e não apenas um custo”, de forma a acelerar o crescimento das próximas décadas. Corretíssimo!
Exemplo? As inovações em saúde, necessárias e essenciais, deverão ajudar a saúde e “mudar o jogo social e econômico”, pois “poucos investimentos atendem a tantas necessidades sociais atuais, melhorando substancialmente o bem-estar e reduzindo a desigualdade (7). Acredito que não há qualquer dúvida a respeito: todas as doenças atingem com muito mais intensidade e força, as pessoas e as áreas mais vulneráveis da sociedade, em qualquer País.
De acordo com estudo feito pela Bloomberg New Economy Fórun, e também publicado pela McKinsey em 26/01/21 (8), e com base na experiência mundial de combate ao coronavírus, delegados do NEF identificaram cinco pontos importantes de preparação, caso se queira, de fato e concretamente, enfrentar os desafios de saúde pública dos próximos anos:
E conclui o trabalho: “os líderes devem ajudar a concretizar a saúde inclusiva para todos, de forma eficiente e resiliente, colocando a saúde no centro da política e colaborando amplamente. Isso não será fácil. Mas a história sugere que podemos mais uma vez nos erguer para alcançar esse objetivo digno”.
Não há que se questionar: saúde inclusiva e de melhor qualidade (preventiva ou curativa), além de expandir a força de trabalho, também aumenta sua produtividade e, consequentemente, colabora diretamente para um crescimento sustentável da economia. Mas mais do que isso, propicia bem-estar e segurança à toda população, principalmente aquela mais carente.
Se de um lado as pandemias aumentam de forma substancial os gastos com saúde e reduzem de forma significativa as taxas de crescimento econômico (9), os investimentos em saúde (que inclui melhorias no saneamento básico), por sua vez, não só evitam desperdícios de recursos – de toda a sorte - em doenças evitáveis, mas, principalmente, poupam vidas humanas e evitam sofrimentos desnecessários (10). Além do que, como aqui já se escreveu, são os investimentos em saúde, de uma forma geral, que contribuem para o crescimento e a estabilidade econômica (11), na medida em que, entre os benefícios já citados, permite que as pessoas trabalhem mais tempo e com alta produtividade, faltem menos por causa de doenças crônicas e tenham desempenho educacional e de aprendizado muito melhor.
Lamentavelmente, a pandemia agravou o que já era muitíssimo grave e expôs uma realidade que muitos queriam ignorar, ou seja, que a sociedade brasileira e extremamente desigual e que um dos pontos que mais colaboram para isso é a precariedade dos serviços de saúde. Consequentemente, se o combate à desigualdade já era um grande desafio para o Brasil, no qual a melhoria da saúde pública punha-se com essencial, agora, diante da crise pandêmica que se apresenta, é fundamental priorizá-la. É bom não esquecer, melhorias na saúde, além de proporcionar gigantescos benefícios sociais e segurança às pessoas, ainda propicia crescimento e desenvolvimento econômicos.
1. “Esperança no tardio comitê” foi o Editorial do Estadão do último dia 26. Escreveu o editorial: “É hora de abaixar as armas e trabalhar decididamente pela saúde pública. Não se enfrenta a pandemia de coronavírus diminuindo sua gravidade, inventando falsos remédios e, principalmente, disseminando irresponsabilidade e desumanidade.
Ainda que tardia, a criação do comitê de coordenação é motivo de esperança. Não convém desperdiçar nenhuma oportunidade de mudança de rota do governo federal no combate à pandemia. O que se viu ao longo do último ano foi intolerável (grifos meus). A criação do comitê de coordenação contra a covid-19 é um passo tardio, mas positivo”.
2. O IHME (Institute for Health Metrics and Evaluation) da Universidade de Washington, prevê para o Brasil, considerando as circunstâncias atuais, que o pico da pandemia no País será na última semana de Abril, com quase 4 mil mortes diárias. Prevê o estudo, ainda, que até julho deste ano o Brasil lamentará mais de 563 vidas perdidas;
3. Aumento incontrolável do déficit e da dívida pública, da inflação, do desemprego, aumento no número de pessoas fora do mercado do trabalho e/ou vivendo abaixo da linha de miséria, descontrole e inércia nas atividades voltadas à proteção do meio-ambiente e de desenvolvimento do comércio exterior, de melhoria da educação e da segurança pública são apenas mais alguns exemplos;
4. Em webinar para discutir o agravamento da pandemia e o adiamento do ajuste fiscal (publicado na Conjuntura Econômica da FGV, de março deste ano), o pesquisador do IBRE/FGV, Manoel Pires foi claro: “A impressão que eu tenho do cenário que estamos vivendo é de que há que refazer tudo que fez no primeiro ano, em maior ou menor grau”. E entre outros, fez o seguinte comentário: “o mais preocupante neste momento é a perspectiva de que a maior parte dos países consegue avistar uma saída da crise econômica, enquanto nos mantemos com perspectivas ruins devido à falta de contenção da crise sanitária (grifos meus). “Estamos falando de um País que não aprendeu a usar máscara e não consegue comprar vacina pelo SUS”. E concluiu: “A crise hoje do ponto de vista sanitário é muito pior que no ano passado, e existe a possibilidade de que ela se arraste pelo segundo semestre, o que nos fará gastar com políticas que não geram crescimento, apenas alívio” (grifos meus)
5 .“STF: parcialidade, incoerência e desprestígio”, artigo de Carlos Alberto Di Franco publicado no Estadão do último dia 05. Escreveu Di Franco: “Hoje o tribunal é fonte de insegurança jurídica e uma das instituições com maior rejeição”. E prossegue: “Esperamos, todos, que o Supremo deixe de ser um partido político e volte a ser um tribunal constitucional”;
6. Pesquisadores da McKinsey: de Londres, Penny Dash, Grail Dorling eKristin-Anne Rutter; de Chicago, Katherine Linzer; de Berlim, Aditi Ramdorai; de São Francisco, Jaana Remes; e de Detroit, Shubham Singhal;
7. “Em todo o mundo, os pobres têm uma chance maior de sofrer problemas de saúde: a expectativa de vida do grupo de 1% de renda inferior nos Estados Unidos é 14 anos inferior à de 1% do topo, e a diferença é semelhante em países com saúde universal sistemas” (“NEF Spotlight: saúde global na era pós-COVID-19”, artigo publicado pela McKinsey em 26 de janeiro de 2021);
8. Responsáveis pelo estudo da Bloomberg New Economy Forum: Carolina Aguilar, Andrew Browne, Penny Dash, Rik Kirkland, Connor Mangan, Christophe Verstreken, Matthew Wilson, Jonathan Woetzel e aos delegados participantes por suas contribuições para este artigo;
9. “No geral, estimamos que o custo dos problemas de saúde foi de mais de US $ 12 trilhões em 2017, cerca de 15% do PIB real global. Choques de saúde como a pandemia COVID-19, influenza H1N1 e SARS podem resultar em custos humanitários e econômicos adicionais. A pandemia COVID-19 e suas repercussões, como as medidas de abrigo implantadas para controlar a propagação do vírus, devem reduzir o PIB global em 3 a 8 por cento em 2020 (McKinsey Global Institute: “Priorizando a saúde: uma receita para a prosperidade” – 08/07/20 – Autores do Estudo: Por Jaana Remes, Katherine Linzer , Shubham Singhal , Martin Dewhurst , Penelope Dash , Jonathan Woetzel , Sven Smit , Matthias Evers , Matt Wilson , Kristin-Anne Rutter e Aditi Ramdorai);
10. “Priorizando a saúde: uma receita para a prosperidade – 08/07/20”. “O Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), a instituição que mantém o banco de dados líder sobre a carga global de doenças projeta que a carga global de doenças (medida em anos de vida ajustados por incapacidade) diminuirá a uma taxa mais lenta do que no passado. Isso se aplica particularmente a economias maduras, onde a população está envelhecendo e enfrenta mais problemas de saúde relacionados à idade e à renda, como diabetes, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer. No entanto, maiores ganhos de saúde são esperados em países de baixa renda, muitos dos quais ficam atrás dos países de alta renda em expectativa de vida e outras medidas de saúde, principalmente de causas evitáveis e tratáveis, como diarréia e malária, distúrbios nutricionais e crianças pobres e saúde materna”. “Estimamos que a carga global de doenças poderia ser reduzida em cerca de 40 por cento aplicando intervenções conhecidas em segmentos mais amplos da população e com maior adesão às ferramentas mais eficazes disponíveis. Uma redução da carga global de doenças dessa magnitude traria benefícios significativos à saúde. A mortalidade infantil pode cair 65 por cento até 2040. As mortes por câncer podem diminuir em 29 por cento, as mortes por doenças cardiovasculares em 39 por cento e as doenças tropicais negligenciadas e as mortes por malária em 62 por cento. No geral, mais 230 milhões de pessoas estariam vivas em 2040, metade delas com menos de 70 anos. Para as pessoas de meia-idade, a mudança poderia estender o número de anos com boa saúde em uma década, elevando essencialmente 65 os novos 55. A cada região do mundo experimentaria uma melhoria neste intervalo”;
11. Ainda segundo estudos do McKinsey aqui já citado: “Os benefícios econômicos das melhorias na saúde que dimensionamos são substanciais o suficiente para adicionar US $ 12 trilhões ou 8% ao PIB global em 2040, o que se traduz em um crescimento 0,4% mais rápido a cada ano. Esses benefícios surgem por meio do mercado de trabalho, tanto pela expansão do emprego futuro por meio de menos mortes prematuras, menos condições de saúde e maior participação na força de trabalho de pessoas mais saudáveis, quanto por meio dos ganhos de produtividade alcançados por trabalhadores física e cognitivamente mais saudáveis”;
Em 2040, mais 245 milhões de pessoas poderão ser empregadas. Cerca de 60 milhões deles teriam evitado a morte prematura de doenças cardiovasculares, câncer, malária e outras causas, acrescentando US $ 1,4 trilhão ao PIB de 2.040. Lidar com transtornos mentais, diabetes ou outras condições não seria mais uma barreira para ingressar na força de trabalho de um equivalente a cerca de 120 milhões de trabalhadores em tempo integral, contribuindo com US $ 4,2 trilhões adicionais. Outros US $ 4,1 trilhões poderiam ser desbloqueados expandindo a participação na força de trabalho entre três grupos: populações mais velhas para as quais uma saúde melhor pode ser uma oportunidade de trabalhar por mais tempo (cerca de 40 milhões de pessoas), cuidadores informais que não precisam mais cuidar de seus entes queridos (12 milhões pessoas) e pessoas com deficiência que podem ir trabalhar porque os locais de trabalho se adaptaram às suas necessidades (oito milhões de pessoas).
Por último, melhorar a saúde pode aumentar a produtividade e elevar o PIB em até US $ 2,0 trilhões, reduzindo o presenteísmo de condições crônicas, como dor lombar, mas também por meio do investimento em nutrição infantil, que melhora a saúde cognitiva e física da futura força de trabalho. O simples fato de abordar os problemas de saúde mental e comportamental dos adolescentes, que afetam cerca de 60 milhões de jovens em todo o mundo, poderia desbloquear US $ 600 bilhões até 2040, aumentando seu desempenho educacional e potencial de renda.