É comum o entendimento de que os gastos logísticos vêm aumentando em todo o mundo. Estatísticas têm indicado que esses gastos, não só nominalmente, mas também como percentual do PIB de um determinado país ou como percentual da receita líquida das empresas, vêm crescendo de forma contínua.
Não nos cabe aqui discutir a qualidade das estatísticas produzidas pelos diversos institutos de pesquisa ou de análise logística que, periodicamente, publicam os gastos logísticos realizados por países ou empresas em períodos selecionados. São instituições sérias e que realizam, através de um corpo de profissionais competentes e de altíssima reputação, um trabalho de levantamento de dados extremamente importante. Assim como as empresas que, ao realizarem seus próprios levantamentos, procuram fazê-lo da melhor forma possível, como forma de refletir suas realidades operacionais.
No Brasil, considerando suas dimensões continentais e ainda sua precária infraestrutura logística, gastos relativos à movimentação de pessoas ou mercadorias (de insumos ou de produtos finais) têm aumentado de forma significativa e até mesmo acima das demais despesas operacionais. Mas isso, de forma alguma, pode ser considerado como indício de piora na qualidade das atividades logísticas correspondentes. É preciso compreender que qualquer atividade empresarial, a logística entre elas, precisa se adaptar às características e circunstâncias incontroláveis que se apresentam.
Além do que, na medida em que se agregam novos serviços às atividades de movimentação de mercadorias, os novos valores de R$ por km ou R$ por m³, por exemplo, não podem ser comparados com aqueles calculados anteriormente sem as ponderações e cuidados devidos. E agregar novos e mais complexos serviços às atividades logísticas, como se sabe, é tendência mundial e que leva a logística para uma conceituação muito mais estratégica do que operacional, isto é, muito mais ampla e abrangente, e que busca a efetiva integração de toda a cadeia de suprimentos. Esse é, inclusive, o papel do novo e moderno operador logístico que, ao se modernizar e atender as exigências do mundo atual, exerce mais o papel de parceiro estratégico do que operacional.
Porém, e independentemente das causas que fazem com que os gastos logísticos variem, é fundamental que se realize diagnóstico preciso e confiável. Do contrário, corre-se sério risco de se agravar ainda mais os problemas existentes e, até mesmo, criar outros oriundos de efeitos colaterais não previstos. Os danos, às vezes, podem ser irreparáveis.
E se um correto diagnóstico é imprescindível, sistemas de medição que reflitam, de fato e concretamente, o que se está analisando, também são necessários. Ao criarem o “Balanced Scorecard” (sistema de gerenciamento estratégico), por exemplo, Kaplan e Norton nos ensinaram que não se pode gerenciar o que não é medido. Ao que eu acrescento: dados precisam ser transformados em informações e estas em conhecimento, de tal forma que os famosos KPIs (key performance indicators) tragam, ao final de tudo, conhecimento sobre as operações ou atividades em questão.
Em artigo publicado há cerca de seis anos (“Gastos e Custos Logísticos: É preciso Diferenciá-los para Melhor Compreendê-los”, revista Mundo Logística nº 34, de maio/junho de 2013) procurei diferenciar os conceitos entre “gasto” e “custo” logístico para explicar que o simples cálculo de percentuais de custos logísticos com relação à receita líquida das empresas, ou com relação aos quilômetros rodados, ou ao total da produção de um país, por exemplo, sem uma análise mais detalhada e comparada à luz de outros índices de desempenho, pode levar a conclusões incorretas. O mesmo vale para quando não se analisam as variações de gastos (ou custos) com base no conceito de “custo total”, não sendo incomum, ainda hoje, executivos acreditarem que seu custo logístico está aumentando por conta de determinada ineficiência logística (ainda não detectada, portanto) quando, na verdade, o que está ocorrendo é um aumento de seus gastos logísticos por realizar vendas ou compras de localidades mais distantes, por exemplo.
É bastante provável que se aumente o gasto com a logística quando se compram insumos ou se vendem produtos para lugares mais distantes ou com maiores dificuldades de acesso. Mas parece óbvio que essas decisões somente foram tomadas a partir do momento em que os preços dos insumos desse novo fornecedor – mais distante que o anterior – se mostraram suficientemente menores para compensar o aumento do gasto com a nova logística. Esse tipo de análise também vale quando se quer alcançar novos mercados e aumentar as vendas. Com a sofisticação dos sistemas contábeis e a inclusão de novas atividades na logística, também é possível que os gastos logísticos apresentados em uma demonstração de lucros & perdas estejam aumentando simplesmente por que despesas, anteriormente classificadas em outras rubricas, agora passaram a fazer parte do “gasto logístico”.
Variações nos gastos com a logística podem ocorrer, portanto, independentemente do nível de eficiência de uma determinada operação, sendo por esse motivo que, quando assim caracterizadas, não as classifico como variações de custo, mas simplesmente de gasto. Aumentos de gastos logísticos podem ocorrer quando se transita em estradas mal conservadas, em locais mais congestionados ou com horários operacionais mais limitados, por exemplo, cujas soluções estão fora do alcance do operador. Não há dúvidas que regiões com maiores índices de roubo de carga terão gastos maiores com gerenciamento de riscos, segurança e seguro. Operações dedicadas, comparadas com operações não dedicadas, também têm diferenças significativas no R$ por km analisado. Dependendo do nível de eficiência com a qual ocupamos determinado equipamento de transporte, teremos R$ por M³ diferentes, mesmo para R$ por m iguais. E, como já se escreveu, por se agregar novos serviços ao transporte (documentação, serviços de despacho, aluguel de embalagens, ajudantes etc.) e cobrá-los juntamente com o frete, o índice R$ / m tem valor totalmente diferente do R$ / km de uma operação na qual somente o serviço de movimentação foi considerado.
Variações de gastos (ou custos) logísticos, ou simplesmente de transporte, em relação ao que for, precisam ser analisadas ponderadamente e dentro de um contexto específico. Comparações simplistas, entre períodos, empresas, regiões ou produtos diferentes, podem ter significados totalmente diferentes uns dos outros e, se não observados com cautela, impedir que se façam avaliações corretas sobre níveis de eficiência operacional. Não há dúvidas que é sempre necessário analisar os motivos pelos quais houve determinado aumento nos gastos com a logística, mas é fundamental que essa análise seja feita a partir de medições confiáveis e diagnósticos precisos.
Diante do exposto e considerando que os serviços logísticos, incluindo-se o transporte, são soluções personalizadas e adaptadas às exigências e necessidades de cada um, pode-se concluir que:
1º) A totalidade ou parcela significativa do aumento dos gastos logísticos pode ser resultado de mudanças estratégicas das empresas, que descobrem novos mercados, mais distantes e complexos, tanto para aquisição de insumos como para venda de produtos acabados, nada tendo a ver com o grau da “eficiência logística”;
2º) Parte importante do gasto com logística deve-se a fatos externos às suas correspondentes atividades, não cabendo, portanto, qualquer responsabilidade a quem as realize ou à solução apresentada;
3º) Análises mais completas e corretas exigem avaliações conjuntas de vários índices de desempenho, como única forma de se ter o correto entendimento das diferentes operações e em suas diferentes complexidades e circunstâncias;
4º) Os dados obtidos, transformados em informações, e estas, transformadas em conhecimento, é o caminho lógico e insubstituível para que se tenha um diagnóstico preciso e confiável, capaz de refletir, de fato, o evento que se quer analisar; e
5º) A análise sob o conceito de “custo total” é fundamental, posto que análises independentes, sem as devidas comparações do que se está alcançando, mesmo com gastos logísticos maiores, levam a erros de análise e diagnóstico.
A não consideração desses pontos, e de outros aqui não abordados, em quaisquer análises sobre a eficiência das operações logísticas pode gerar diagnósticos incorretos, injustos e, consequentemente, prontos para indicar soluções, na melhor das hipóteses, sem quaisquer efeitos práticos, mas podendo, sem dúvida, agravar ainda mais aquilo que já era crítico.