Quando entramos em um aeroporto, colocamos toda a nossa vida em perspectiva só de observar o fluxo intermitente das chegadas e partidas. Entre a emoção sublime de um reencontro há muito esperado e a deliciosa liberdade de ir onde quisermos, e outras constatações mais mundanas (como a reclamação sobre o preço do cafezinho), muita vida acontece. Vida e negócios saltando pelos saguões e hangares.
Aeroportos não dormem, mas não são imunes às tragédias. Essa constatação ficou evidente por força do desastre ambiental que acometeu o Rio Grande do Sul e gerou o fechamento do aeroporto Salgado Filho, principal terminal aeroportuário do Estado.
Os prejuízos da abrupta parada são sentidos por toda a sociedade e estão sendo endereçados por muitos atores. Do lado público, vislumbra-se a necessidade de coordenação entre ANAC, Ministério dos Portos e Aeroportos, Advocacia-Geral da União (AGU), Tribunal de Contas da União (TCU), Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) e tantos outros órgãos com interação com a infraestrutura aeroportuária. Do lado privado, a concessionária, os passageiros, as seguradoras e as entidades do terceiro setor também se mobilizam para a recuperação da “normalidade”.
O grande esforço de reação rende boas perspectivas para a retomada da operação do ativo. O embarque e o desembarque remotos já têm sido realizados nas dependências do aeroporto desde meados de julho, com voos ainda decolando e pousando da base aérea de Canoas.
Como noticia o Valor Econômico, prevê-se a reabertura do aeroporto para pousos e decolagens, em outubro, de forma parcial. A reabertura total está prevista para dezembro, oxalá que seja a tempo da alta temporada turística da Serra Gaúcha.
Para que tais expectativas se cumpram, é essencial que as autoridades públicas e as seguradoras ajam de forma coordenada, para prestar as medidas operacionais e financeiras necessárias ao retorno da operação.
Ações para alívio financeiro já foram tomadas pelo BNDES, com a suspensão dos pagamentos dos empréstimos tomados pela Fraport por 12 meses. A medida, embora relevante, não é suficiente. Igualmente importante para a sustentabilidade financeira do empreendimento concedido é a agilidade no processamento do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro apresentado pela concessionária, o qual, segundo noticiado pelo Valor Econômico, é quantificado em cerca de R$ 700 milhões.
Para futuras concessões aeroportuárias, é fundamental pensar na resiliência dos ativos, tanto na parte de projetos de engenharia quanto na existência de mecanismos contratuais capazes de absorver, com agilidade e eficiência, os impactos dos eventos climáticos extremos.
No Antropoceno, o direito ao meio ambiente saudável ganhou status de direito humano. Sendo assim, é dever do Estado (e responsabilidade de toda a cadeia de valor) que os contratos públicos se adaptem à nova realidade climática.