Forças ocultas existem, mas não se percebem de forma clara, como um impeditivo do processo de expedição, cuja meta principal visa essencialmente despachar o produto e, com isto, poder emitir a fatura. Forças ocultas constituem dificuldades que atuam no sentido contrário à evolução do processo de diversas formas, causando baixo desempenho, má qualidade do serviço de transportes, aumento de custos, atrasos, metas não atingidas etc.
A área de expedição convive com um componente de estresse contínuo, que exige resultados, pois a empresa depende das metas estipuladas. Logo, qualquer ação que possa, mesmo que minimamente, interferir negativamente no processo, é visto como uma ameaça. Os componentes que atuam no sentido contrário da implantação de um projeto que garanta o bom desempenho operacional e econômico no processo de expedição de uma organização são variados. Os principais identificados são:
- Tempo disponível: um fator que barra qualquer tipo de mudança é a falta de tempo do gerente de Logística. A área de expedição é muito atribulada, devido a problemas de naturezas diversas, dentre elas a necessidade de cumprimento das metas estabelecidas. Conseguir a atenção do gerente de Logística, propondo mudanças é uma tarefa que exige tempo e paciência. Uma exceção a esta regra são os casos em que já existe, por parte do gerente, a determinação de revisar a estrutura de expedição em uso. Conseguir um contato com o gerente exige muita paciência, talvez porque sua pilha de tarefas é maior do que consegue executar ou simplesmente não quer dispender seu tempo com algo que não o ajude no cumprimento das metas.
- Receio de mudanças: o motivo principal que leva os dirigentes a não aceitar com facilidade mudanças no processo da expedição é porque não querem correr riscos, uma vez que qualquer problema causado pelas mudanças acarreta prejuízo para a empresa e isto é tudo que precisa ser evitado. O responsável pela logística e que cuida da expedição não quer sequer ouvir falar em mudanças. Para ele, mudanças significam mais problemas e, em suas atividades, o que mais aparece são problemas. Há duas possibilidades de conseguir mudanças: reestruturação da empresa e reformulação dos processos ou determinação expressa da alta administração. Não sendo desta forma, o gerente de Logística dificilmente irá se aventurar em alterar a estrutura vigente, mesmo que apresente problemas, pois a estrutura atual, bem ou mal, o ajuda a atingir as metas da empresa. A operação na expedição, aos olhos do gerente de Logística, está sobre seu perfeito domínio, e em seu modo de raciocinar, a questão é sempre a mesma: por que devo mudar a estrutura que está funcionando? Se a estrutura realmente está bem ou mal, é outra questão que, tendo tempo, poderá ser analisada, mas como tempo está sempre em falta, a possibilidade de mudanças é bastante remota.
- Alta rotatividade: uma das características da área de expedição é a rotatividade das pessoas, mudando de setor ou pedindo demissão. A explicação é simples: trata-se de uma área que trabalha com estresse contínuo. Em algum momento, o funcionário se atém ao tipo de vida que leva e decide mudar quando aparece uma oportunidade. As cobranças são muitas e a compensação financeira não existe e, por isso, muitos trocam de emprego achando que irão encontrar um ambiente melhor em outro lugar. É comum também algum tipo de “favorecimento” individual, principalmente dos responsáveis ou tomadores de decisão, que ao perceber o menor ruído de auditoria na área ou uma simples investigação sobre custos, pedem demissão para evitar qualquer tipo de envolvimento. Conseguir um contato com o responsável pela Logística já é uma tarefa árdua. Some-se a isto o fato de seu contato ter saído do cargo, o que obriga a fazer todo o trabalho de marketing novamente.
- Incompetência do gerente: o gerente de Logística, além de ser um profissional ocupadíssimo, precisa preocupar-se consigo mesmo, acerca de sua remuneração, sua carreira, seus interesses e também sua reputação. Como o gerente de Logística ficou em uma situação delicada: como pode, por exemplo, justificar para a alta administração que durante tanto tempo manteve custos tão altos com transporte de cargas? Como não percebeu isto? Para bom entendedor, a resposta é óbvia: por algum motivo não houve nenhum interesse em se preocupar com custos. Afinal este não é o seu trabalho. O receio de ser inquirido pela sua incompetência em não perceber os altos custos, leva o gerente a desistir de seguir adiante com o projeto, argumentando que está plenamente satisfeito com o trabalho das transportadoras e dispensa um estudo.
- Globalização: a globalização é um fenômeno muito comum. Como decorrência desta estratégia as decisões seguem um padrão e, portanto, apresentam certa rigidez. As filiais de uma multinacional seguem diretrizes estabelecidas pela matriz e têm pouca autonomia para decidir sobre certos assuntos. Se a matriz estabeleceu que o transporte de carga deve ser feito com veículo próprio, não há como convencê-lo de que existem opções terceirizadas mais vantajosas em termos de qualidade e custo. Há casos em que os responsáveis pela logística concordaram com o projeto de redução de custos de transportes, mas no primeiro passo, onde foi solicitado um conjunto de dados históricos, o projeto não vai adiante. Isto porque o fornecimento de dados da empresa tem que ser solicitado via ticket para o setor de tecnologia da informação, o que, além de enfrentar uma burocracia desgastante, leva muito tempo.
- Troca de favores: a troca de favores é uma prática comum e até saudável no mercado onde pessoas agradecem a outras pelos favores obtidos. No Japão é comum levar um presente (uma caixa de bolacha, um engradado de cerveja, um ticket para compra de bebidas, etc.) quando se vai ao encontro de alguém para pedir um favor, ou, quando obtido algo, agradecer dando um presente fazendo uma visita formal à pessoa. A troca de favores se torna danosa e fere os princípios da ética comercial quando assume grandes proporções visando nitidamente obter favorecimentos. Não raro, ocorre este fenômeno no mercado, e o assunto deve ser conduzido com muita discrição, pois se trata de algo antiético, feito de maneira escusa. Soa como ingenuidade imaginar que tal fato inexiste ou é pouco comum. Mesmo em empresas de porte e vestidas de roupagem séria, podem ser encontrados vestígios de favorecimento. Este favorecimento pode assumir proporções variadas. Desde um simples agrado até uma verdadeira “máfia” no interior da empresa, onde são muitos os favorecidos. Esta talvez seja a “força oculta” mais invisível, sendo de difícil ou impossível comprovação, mas que atua de forma contrária para aprovação de qualquer projeto, mesmo que se demonstre uma economia vultosa. É comum encontrar empresas que se interessam por um projeto, mas apenas para saber a metodologia utilizada e, por conta própria, tentar executá-lo internamente, aproveitando a ideia.
Redução de custos
O objetivo é simples: como conseguir reduzir o custo de transportes mantendo ou superando a mesma qualidade. Inicialmente não se sabe se os custos praticados por uma empresa são competitivos e, por isso, é necessário fazer uma avaliação prévia que indicará a viabilidade de continuar com o estudo.
Esta etapa do projeto é requerida porque não se tem o conhecimento dos preços praticados pelas transportadoras. Para avaliar os custos de transportes deve-se inicialmente efetuar um processamento sobre uma massa de dados históricos que fornecerá uma estimativa provável de redução. Esta estimativa é conservadora e tem como intuito determinar a continuidade do processo. O valor obtido em termos percentuais é um termômetro e é suficiente para determinar a viabilidade do projeto de redução de custos. A continuidade depende deste valor, mas depende também da decisão da empresa.
Como exemplo, suponha que seja obtida uma estimativa de 2% de redução. Aparentemente um valor irrisório, que barra o projeto, mas se a empresa gasta dez milhões por mês com transporte de carga, isto significa uma economia de 200 mil, e o gestor pode optar pela continuidade. A experiência obtida ao longo dos anos sugere dois parâmetros que conduzem à realização do projeto: a) valor mensal gasto com transportes superior a 50 mil reais mensais; b) estimativa de redução superior a 20% ou a critério da decisão da empresa.
A primeira limitação é devida ao fato de o estudo apresentar uma estimativa de redução que não cobre o custo de desenvolvimento do projeto. O segundo parâmetro é apenas um valor empírico. Tais valores devem servir como referência não sendo, no entanto, critérios limitadores rígidos, devendo ser analisados os casos que fogem destes contextos.
Um projeto de redução de custos é desenvolvido com profissionais altamente capacitados em logística de transportes e em tecnologia da informação. No setor de logística, o conhecimento das transportadoras em termos de qualidade e preços é de importância estratégica. Isto combinado com diversos algoritmos que processam os dados de carga do embarcador e a afinidade das transportadoras ao perfil de carga e regiões, produz informações em diversos passos na execução do projeto direcionando os estudos.
Depois de efetuada a estimativa de redução, optando-se pela continuidade do projeto, o próximo passo é caracterizar o transporte da empresa em termos de carga e destino. A carga é analisada em todos os aspectos, tais como: fracionamento, volume, peso, tipo de transporte, entregas com limite de data, remédios, valor agregado, cargas perecíveis, maquinários, etc. Além da análise detalhada da carga, deve ser efetuado também um processamento dos destinos para onde são enviadas as cargas. Cada embarcador possui exigências próprias que devem ser consideradas no projeto. Um dos parâmetros requeridos pela maioria é a garantia de entrega no prazo, parâmetro que demonstra a qualidade da transportadora.
Conhecidos a carga, os destinos, o volume e as exigências do embarcador, monta-se o documento licitatório convocando as transportadoras que possuam o perfil adequado às condições do edital para participarem da concorrência. As transportadoras participantes devem ser avaliadas e, se atenderem às condições do edital, são incluídas na base de dados para que sejam submetidos a diversos processamentos.
O projeto continua com novas etapas de avaliação dos resultados, refinamentos, reuniões, adequação de valores até que se chega a um resultado final onde se obtém a classificação das transportadoras. Até este momento, o embarcador não tem conhecimento das transportadoras e estas também não têm conhecimento do embarcador. O projeto finaliza com uma reunião formal entre embarcador e transportadoras onde são apresentadas as empresas vencedoras.
Nesta fase do projeto ocorrem os acertos burocráticos e jurídicos entre as partes interessadas e, ao final do processo, a operação é iniciada. A partir do início da operação, o projeto continua desta vez monitorando os custos praticados, conferindo os conhecimentos de fretes individualmente e informando ao embarcador as disparidades verificadas. Este acompanhamento deve ser feito por um período acordado entre o embarcador e a projetista.
Uma das preocupações das empresas refere-se ao custo de um projeto desse tipo. Cabe salientar que não existe aporte de valor para executar o projeto. Em outras palavras, exceto um custo inicial simbólico que pode ser eliminado conforme tratativas, o projeto de redução de custos é pago como um percentual da economia obtida. A forma de liquidação do valor do projeto pode variar, mas em geral, a prática mostra que a melhor forma é efetuar pagamentos conforme as economias são conseguidas, o que não onera o caixa das empresas. Decorre desta forma de pagamento a necessidade de conferência – o que é muito conveniente para o embarcador – dos conhecimentos de fretes para se apurar o ganho e determinar a remuneração do projetista, uma alternativa boa para ambos.
Resultados
O resultado principal do projeto consiste em uma nova configuração de transportadoras que proporciona uma redução de custos conforme avaliada. Em geral, obtém-se também um aumento na qualidade dos serviços de transportes de carga. Outro benefício decorrente do projeto de redução de custos é a conferência individual dos conhecimentos de transportes, apontando os casos em que houve divergência nos cálculos. Isto ajuda a área financeira da empresa no tratamento de casos especiais onde ocorrem gastos extraordinários.
É comum nas empresas a falta de conferência dos fretes na íntegra, muitas vezes sendo feita por amostragem. Isto é inadmissível em organizações que obedecem a marcos regulatórios, como o Sarbannes-Oxley, que exige verificações completas de todos os cálculos. Resumindo, a empresa, ao contratar o estudo, obtém um suporte que garante qualidade e monitoramento de gastos com fretes, mantendo uma transparência e relacionamento adequados com as transportadoras durante a vigência do projeto.
Há casos em que a empresa está iniciando as atividades no país e, para isto, necessita de uma infraestrutura de transportes. Esta é outra forma de utilização do projeto. A empresa busca transportadoras no mercado com o menor preço. Neste caso, não existe a atividade de determinar a estimativa de redução. O estudo busca então encontrar as transportadoras com melhor preço e qualidade, que atendam às necessidades de transporte. Por ser o início das atividades, o volume a ser transportado é uma estimativa. A carga a ser transportada, no entanto, é conhecida. Os destinatários podem ser conhecidos ou não, dependendo do caso. Os custos do projeto devem ser acordados previamente, não havendo nenhuma remuneração em função da economia, o que não existe em virtude de ser o início das atividades.
Muito se aprendeu com as dificuldades de projetos na área de logística. Um grande ensinamento é que um projeto, por mais que seja viável, depende de pessoas para ser aprovado. Assim, o maior trabalho nem sempre é mostrar a viabilidade, mas sim convencer os tomadores de decisão. É com este propósito que o presente texto mostra as vantagens de projeto com boas chances de redução de custos de transportes ou até mesmo a possibilidade de verificar se os custos praticados são compatíveis com o mercado. Conforme o valor apurado, pode-se chegar à conclusão de que existe interesse em prosseguir com os estudos, ou não, e tudo isto a custo zero.
Bibliografia
Faria, A.C., Costa, M.F.G., Gestão de Custos Logísticos, Editora Atlas 2012.
Christopher, M., Logística Empresarial, Cengage Learning, 2010.
Chiavenato, I., Empreendedorismo, Editora Saraiva, 2006.
Lélis Tetsuo Murakami
Professor na Faculdade de Tecnologia (Fatec) do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (Ceeteps)
Professor da Anhanguera Educacional
Diretor da Lechare Informática e sócio da Bestfretes Logística e TI
lelis.tm@lechare.com.br
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