Em um cenário global onde as questões ambientais, sociais e de governança (ESG) desempenham um papel cada vez mais central nas estratégias empresariais, a implementação de práticas reais e tangíveis nesse sentido torna-se uma necessidade urgente.
Em todo o mundo, líderes e empresários estão proclamando seu compromisso com os princípios ESG (sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa), como temos observado em muitos debates, como os que ocorreram durante o Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês), em Davos, na Suíça, no início desse ano. Na edição de 2024, como não poderia ser diferente, vimos um tema em particular dominar as conversas: a crise climática e a urgência de medidas eficazes.
No entanto, a lacuna entre a retórica e a implementação prática muitas vezes persiste, principalmente em áreas mais desafiadoras, como a da logística de refrigeração, por exemplo.
Isso porque a necessidade de reduzir as emissões de carbono e minimizar o impacto ambiental é uma questão crucial para o futuro sustentável das empresas do segmento. Neste contexto, a mudança de temperatura na logística de refrigeração emerge como uma estratégia pragmática para alcançar metas globais ambientais ambiciosas.
Uma pesquisa intitulada The Three Degrees of Change, coordenada pelo Centro para Refrigeração Sustentável do Instituto Internacional de Refrigeração, apontou que uma simples alteração na temperatura de preservação de alimentos pode ser a chave para um futuro mais verde e econômico.
De acordo com o estudo, uma pequena alteração na temperatura à qual os alimentos congelados são transportados e armazenados pode ter um impacto ambiental significativo sem comprometer a segurança ou a qualidade dos alimentos.
Atualmente, o padrão global estabelece que os alimentos congelados devem ser armazenados a -18°C, uma temperatura estabelecida em meados do século XX, que fornece uma boa margem de segurança. No entanto, essa nova pesquisa sugere que temos refrigerado os alimentos mais do que o necessário, em detrimento do meio ambiente.
Segundo os pesquisadores aumentar a temperatura dos armazéns frigoríficos em apenas 3 graus Celsius de sua temperatura atual não constitui nenhum risco para a integridade de muitos alimentos. Além disso, os dados apontam que tal ação eliminaria a emissão de 17,7 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono por ano.
Isso demonstra como o que antes era visto como um ajuste técnico, agora se revela como um catalisador para a sustentabilidade.
Nesse sentido surge uma questão crucial que requer uma investigação mais profunda: é pertinente manter uma temperatura de -18°C em relação aos produtos alimentícios atuais? A redução das temperaturas de refrigeração abaixo dos níveis necessários leva a um consumo de energia desnecessário, juntamente com emissões de gases de efeito estufa que poderiam ser evitadas? A regulamentação deve mudar?
De acordo com esse estudo, já temos algumas respostas: uma mudança para -15°C resultaria em uma economia das emissões de dióxido de carbono equivalente às produzidas por milhões de automóveis por ano. Outro ponto apresentado é a segurança no que se diz respeito ao congelamento de alimentos nessa temperatura.
Assim, é possível prever que essa transformação não apenas responde às expectativas globais de sustentabilidade e segurança alimentar como também poderá representar oportunidades únicas para as empresas do setor. Isso porque, certamente, tal redução também representaria uma diminuição dos custos da cadeia de abastecimento.
No entanto, as empresas da cadeia de frio estão atadas pelas regulamentações internacionais que estabelecem uma temperatura padrão. Um equívoco, uma vez que a mudança de temperatura representaria não apenas uma adaptação urgente à crise climática, mas uma resposta direta ao clamor mundial por práticas sustentáveis.
A indústria do frio tem a responsabilidade e a oportunidade de contribuir significativamente para a sustentabilidade global e a segurança alimentar, tal como tem feito desde suas origens.
O segredo para uma logística de refrigeração sustentável não reside apenas em compromissos retóricos, mas em práticas pragmáticas e é por isso que essa mudança é tão significativa. Se faz necessário sim mudar resoluções que atualmente não fazem sentido para transformar compromissos ESG em ações tangíveis.
Abraçar essa mudança de temperatura irá trazer não apenas melhorias significativas de impacto ambiental, mas também trará benefícios econômicos para toda a cadeia de refrigerados.
A mudança de temperatura não é uma utopia. Ela é pode ser uma realidade viável para ser implementada nas operações do dia a dia.
Em um cenário onde a sustentabilidade não é mais uma opção, mas uma necessidade, a mudança de temperatura na logística de refrigeração é sim um divisor de águas. Não apenas uma adaptação técnica, mas uma declaração ousada de que o setor está pronto para liderar a transição para um futuro mais fresco, mais verde e, não menos importante, mais rentável.