Em texto que escrevi há quase um ano atrás com minha amiga Eduarda Viela, abordamos solução consensual de controvérsias (SCC) inaugurada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A SCC busca viabilizar a solução consensual de controvérsias relevantes e prevenção de conflitos envolvendo órgãos e entidades da Administração Pública Federal e o setor privado, com mediação realizada pelo TCU.
O TCU atua, nesse caso, com fundamento na Instrução Normativa nº 91/2022 disposições da Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, dispõe sobre a possibilidade de utilização da autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública e ainda, no art. 13, § 1º, do Decreto nº 9.830, de 10 de junho de 2019, o qual prevê que a atuação de órgãos de controle privilegiará ações de prevenção antes de processos sancionadores.
Mariana Carvalho aponta que quatro processos já apreciados, dois contemplam o setor ferroviário (TCs 000.853/2023-2 e 000.855/2023-5) e outros tantos contemplam longos litígios do setor rodoviário, o que demonstra a relevância do instituto para o setor de logística.
O Min. Bruno Dantas, em texto para o Correio Brasiliense, informa o recebimento de número expressivo de pedidos “dos mais diversos setores regulados, como energético, rodoviário, ferroviário, portuário, aeroportuário e de telecomunicações” e “que a soma dos valores em disputa é da ordem de 220 bilhões de reais”.
Dantas indica ainda que o sucesso da iniciativa ocorre pela combinação de um bom arranjo institucional com a perspectiva de soluções tempestivas, em contraposição aos mecanismos tradicionais, sobretudo a tutela jurisdicional. Esta última parte é de extremo relevo pois os meandros processuais de litígios com Administração Pública podem, de fato, conduzir decisões irracionais e com déficit de tecnicidade.
Apesar da evolução na segurança jurídica de sua arquitetura institucional, o rito procedimental da SCC é longo e seu desenho poderá, de per se, dificultar a busca por eficiência que informa o instituto da mediação.
Outras questões de natureza processual merecem ser destacadas. A norma não prevê a possibilidade de instauração de SSC por iniciativa direta de particulares ou unidades jurisdicionadas, nem de ofício pelo relator do processo junto ao TCU, o que parece contrariar um dos principais objetos da norma, qual seja, o aumento do diálogo entre setores público e privado.
Ainda que o procedimento possa ser aprimorado, suas vantagens superam os obstáculos. Como bem ressaltado por Mariana Carvalho em texto para Agência Infra, “as soluções adotadas possibilitaram não apenas ajustes em termos contratuais – inclusive no que se refere à remuneração, à vigência e às obrigações estabelecidas – como também a formulação de metodologia de cálculo de indenização devida por concessionária”.
A experiência bem-sucedida pode ainda ser replicada para tribunais de conta estaduais, como bem ressaltam Cesar Oliveira e Jolivê Filho, “independentemente de disporem ou não de normas similares à Instrução Normativa 91/2022 do TCU, os tribunais de contas estaduais ou municipais estão juridicamente autorizados à adoção de mecanismos similares de solução consensual”.
Há, portanto, um bom caminho para desenvolvimento da consensualidade administrativa em contexto de maior maturidade institucional; diferentemente da corrida maluca (e show de insegurança jurídica) que marcaram a celebração de acordos de leniência no contexto da lava-jato.
*Por Mariana Avelar, membro da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.